quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Um dom caro

- Isso tem seu custo.
- O quê?
Aprender a enxergar um enigma em tudo. Eles estão em todos os lugares. Assim que começa a vê-los, é impossível parar. O que acontece é que as pessoas e todos os enganos e desilusões que informam o que fazem tendem a tornar o enigma mais fascinante. Com certeza, elas nem sempre gostam de serem vistas assim. 
- Parece-me uma maneira solitária de viver.
- Como eu disse, tem seu custo...







Eu, Álison

William Thomson

Era um estímulo para os alunos, esse azougado professor. Nunca se sabia o que esperar dele.
Como todos os homens de personalidade vigorosa, tinha os seus preconceitos. “Sempre desconfiei das palavras e obras do espírito humano”.
E assim, “Wullie Tamson” – como o chamavam seus amigos escoceses – tornou-se o primeiro Barão Kelvin. Mas “Wullie Tamson” continuou a ser o mesmo homem honesto, franco, enérgico e brincalhão.
Um dia seus amigos levaram-no a ouvir uma sinfonia de Beethoven. Ficou muito impressionado. “Pense-se que coisa complexa é o resultado de uma orquestra a tocar”.
“Os que vivem devagar criam seus próprios obstáculos”.
E agora ele se aproximava do fim do caminho. De hora em diante se limitaria a aprender. E então o mais sábio dos mestres, a Morte, veio buscar esse aluno em seu octogésimo terceiro ano e conduziu-o ao Grande Laboratório para o Último Experimento.







Eu, Álison

Triste e desagradável

Quanto aos sábios que se julgam pequenos deuses, a amizade quase nunca os une, ou, se isso às vezes acontece, é uma amizade sempre triste e desagradável, e restrita a um número muito pequeno de pessoas. Quanto a dizer que eles não gostam absolutamente de ninguém, eu teria apenas um escrúpulo: a maioria dos homens são loucos, pode-se mesmo dizer que não há nenhum que não tenha várias espécies de loucuras; ora, é na semelhança que estão fundadas todas as amizades.






Eu, Álison

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Seu destino era partir-se em pedaços

Ele achou que evitar a amarga despedida pouparia seu coração de quebrar-se em pedaços e de fazê-lo sentir o peso da distância.
 Mas o que ele não contava era que não vê-la teria um efeito tão devastador em seu peito quanto estar ao seu lado para dar o último adeus.
Sem conseguir fugir de sua sina, seu coração partiu-se mesmo sem tê-la visto partir. Ele partiu-se, pois não pôde vê-la pela última vez.
E hoje contam sua história. O homem que, desde então, dedica sua vida a colher pelo mundo afora os cacos perdidos do seu coração confrangido e anseia uni-los com o perfume de quem os partiu.
Mas mal sabia ele que não mais veria quem os partiu e ele teria que uni-los com o que sobrou dentro do seu peito. A dor que vivia e a dor que sabia que não acabaria...
Cacos espetam. Cacos machucam.
Cacos se partem e levam consigo o dono de um coração alquebrado e doído.






Eu, Álison

Fazia frio

Como um fantasma que se refugia
Na solidão da natureza morta,
Por trás dos ermos túmulos, um dia,
Eu fui refugiar-me à tua porta!

Fazia frio e o frio que fazia
Não era esse que a carne nos conforta
Cortava assim como em carniçaria
O aço das facas incisivas corta!

Mas tu não vieste ver minha Desgraça!
E eu saí, como quem tudo repele,
— Velho caixão a carregar destroços —

Levando apenas na tumba carcaça
O pergaminho singular da pele
E o chocalho fatídico dos ossos






Eu, Álison

03 de novembro

Deus sabe quantas são as ocasiões em que me deito na cama com o desejo, e às vezes a esperança, de não tornar a acordar. E de manhã abro os olhos, revejo o sol e me sinto miserável! Oh, não ser eu caprichoso a ponto de acusar o tempo, ou a um terceiro, uma empresa falhada, talvez, para que o insuportável fardo das mágoas não pese inteiro sobre mim! Desgraçado que sou! Sinto, e bem no fundo, que toda a culpa é minha... Não, a culpa não! Basta que eu traga hoje oculta em meu peito a fonte de todas as misérias, do mesmo modo que trazia outrora a fonte de todas as venturas.  Não sou eu o mesmo homem que dantes bracejava numa inesgotável sensibilidade, que via surgir o paraíso a cada passo e tinha um coração capaz de estreitar dentro de si o amor do mundo inteiro? Mas agora este coração está morto, já não brota dele nenhum encanto, os meus olhos estão secos e os meus sentidos, que já não são mais aliviados por lágrimas refrescantes, também estão secos e rasgam sulcos de medo em minha testa. Eu sofro muito, pois perdi tudo o que me causava delícia à vida, essa força divina, vital, com a qual criava mundos ao redor de mim. Ela passou... Quando olho da janela para a remota colina, é em vão que vejo acima dela o sol da manhã atravessar o nevoeiro e brilhar no fundo pacífico do prado, e o brando ribeirão serpentear à minha busca por entre os salgueiros despidos de folhas... Oh, toda essa magnífica natureza é fria para mim, inanimada como uma estampa colorida, e todo esse espetáculo já não consegue bombear do coração à cabeça a menor gota de um sentimento venturoso, e o homem total está ali, em pé diante de Deus como um poço seco, como um balde furado. Muitas vezes me prostrei no chão implorando lágrimas a Deus, como um lavrador clama por chuva quando vê um céu de bronze sobre sua cabeça e a terra ao redor de si a morrer de sede.
Mas, ah, sinto-o, Deus não concede a chuva e o sol às nossas importunas súplicas... E esses tempos cuja recordação me atormenta, por que eram eles tão felizes, senão pelo fato de que eu esperava os seus desígnios com paciência? E por que recebia de coração inteira e intimamente agradecido as delícias que ele derramava sobre mim?





Eu, Álison

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Das maravilhas

"Gostaria de não ter chorado tanto!", disse Alice, enquanto nadava de um lado para outro, tentando encontrar uma saída. "Parece que vou ser castigada por isso agora, afogando-me nas minhas próprias lágrimas! Vai ser uma coisa esquisita, lá isso vai! Mas tudo está esquisito hoje".






Eu, Álison