segunda-feira, 16 de julho de 2012

R. Schumann

Um duplo talento despertara nele prematuramente – um dom para a literatura e um dom para a música.
Surpreendera o olhar da amada num arco-íris lunar e imaginou ouvir-lhe o riso da brisa ao dançar sobre um lago perdido entre as montanhas. "Nesse momento aprendi a ideia sublime da Divindade".
Robert voltava-se amiudadas vezes para o teclado quando sentimentos profundos demais para lágrimas – e palavras – se lhe agitavam no cérebro.
Era sujeito a intensos acessos de melancolia. Escreveu à mãe, referindo-lhe as suas desventuras, num estilo calculado para apertar-lhe o coração. “Se eu, ao menos, tivesse aqui alguém que me compreendesse direito e com simpatia e que tudo fizesse por mim em virtude de um amor puro e desinteressado que me dedicasse!”.
“Emociono-me com demasiada facilidade”, queixava-se ele.
“Nem posso matar-me, a despeito do meu desespero, porque me falta o dinheiro suficiente para adquirir uma pistola”.
Eram os seus dias uma série de estados de espírito que flutuavam violentamente entre o êxtase e o desespero.
Além disso, repartira o tempo entre a música e a poesia. Expressava-se igualmente bem com o piano e com a pena, o que, aliás, representava para ele, de certa maneira, uma fonte de fraqueza. “Se ao menos o meu talento para a poesia e para a música se concentrasse num ponto único, a luz não se ofuscaria tanto assim...”.
Na amizade do gênio o prato da familiaridade é condimentado com o sal do respeito.
“Sentimentos estranhos agitavam-me o coração...”. “Permiti que essa noite, ao menos, se passe sem que eu perca a razão!”
Nessa altura, Schumann desfaleceu. Durante toda a vida obcecara-o a ideia de que estava perdendo a razão. Referia-se ao “lado obscuro” da sua vida, manifestava o desejo de divulgar, algum dia, o segredo de uma “grave enfermidade psíquica” de que padecera. Um dia, ele teria a “chave” de todas as suas ações, “de toda a minha estranha natureza”.
“Poderá o jovem Schumann edificar uma catedral de ideias musicais?”.
Essa infâmia abateu a natureza sensitiva de Schumann.
Schumann não era homem com quem se lidasse facilmente. Era distraído, sem cerimonioso, arrebatado, irresoluto e caprichoso com o vento. Inclinado à melancolia, acreditava que o casamento o curaria dos seus periódicos acessos de tristeza.
Referia-se, repetidamente, à sua boa fortuna de possuir “uma esposa à qual estou ligado pela arte, pela afinidade mental, pelo hábito de muitos anos de amizade e pelo mais profundo e mais sagrado amor...”.
O meu respeito pelo gênio de Robert, pela sua inteligência e pelos seus dons de compositor aumenta com cada uma de suas obras.
Padecia, continuamente, de acessos de melancolia e fazia viagens frequentes ao campo para tratar da saúde. Com os nervos tensos e a ponto de arrebentar, tinha medo da morte e tinha medo da vida.
Para Schumann, porém, valia o oferecimento como escápula temporária às algemas do desespero.
Era um homem de poderosas emoções e dificuldade de expressão. “Quando os meus pensamentos são mais eloquentes”, lamentava-se, “é quando me vejo mais incapacitado de falar”.
Excesso de gênio, carência de talento. Tal era o paradoxo daquele homem, que padecia da excitabilidade nervosa provocada por um cérebro demasiado fértil. Essa excitabilidade nervosa trouxe-lhe, de um lado, o fardo das aflições e, de outro, o condão de cantar.
Pouco depois, decompunham-se as notas num milhar de sons majestosos. Que maravilha! Brilhavam-lhe nos olhos visões do paraíso. “Sofro maravilhosamente”.
Uma bela manhã, saltou da cama dizendo que os anjos lhe estavam cantando um tema que ele precisava copiar. Saiu depois impetuosamente de casa e precipitou-se no Reno. Foi salvo e mandado para um hospício.
Tal foi a tragédia de seu espírito. O artista hipersensitivo vivera uma vida de frustração mental. Não poderia ser feliz o final dessa historia de um gênio tão poderoso com tão limitadas oportunidades de expressão, vulcão ativo de música peado pelas cinzas de um mundo desatento. Havia, forçosamente, de explodir.
Durante dois anos arrastou-se ele no meio dessa morte viva. Vivia num mundo de música divina – aquelas harmonias celestiais que lhe roubavam o repouso.
A luz do sol é apenas uma lembrança irrisória na treva da tormenta.
No instante, porém, em que ela se ergueu, ele a beijou. O beijo instintivo, confiante e indefeso de uma criancinha.





Eu, Álison

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