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domingo, 3 de novembro de 2013

Ele não disse nada

Leonardo foi chamado para ajudar Arthur, um homem que havia sofrido um grave acidente. Ele tinha ficado seriamente ferido e acabou completamente paralisado, apesar de conseguir manter-se consciente. O único movimento que lhe restou foram o dos olhos. Os médicos estavam surpresos por ele ter conseguido sobreviver e não achavam uma explicação para o fato de ele ainda estar vivo dado a gravidade de seu acidente, mas não contaram nada a sua amiga Gillian, que permanecia constantemente junto dele e que, apesar de também ter participado do acidente, não havia sofrido ferimentos graves.
Leonardo não foi escolhido por acaso para ajudar Arthur, mas sim foi escolhido porque não era uma pessoa normal. Leonardo era um mestre em ler expressões faciais. Os mínimos movimentos, os menores detalhes, os gestos mais simples. Leonardo via tudo. Havia pessoas que achavam que o que ele fazia era um truque, ou que ele tinha algum tipo de poder, pois era a única explicação para o que ele conseguia fazer. Ele já fazia isso há anos e foi chamado porque era reconhecido como o melhor no que fazia.
Chegando ao hospital, ele encontrou Arthur em seu leito e Gillian a seu lado, ainda mais angustiada com a situação por não conseguir compreender o que o amigo estava sentindo ou o que queria dizer. Leonardo explicou como ajudaria a pobre moça.
- Eu leio expressões faciais. Fale com seu amigo e vou dizer o que ele está sentindo. Quase sem querer, Leonardo leu as expressões do rosto da moça e viu que ela acreditava no que ele estava dizendo, apesar de nunca ter tido contato com alguém como ele. Ela começou.
- Como está se sentindo? - perguntou a Arthur, e imediatamente olhou para Leonardo, esperando uma resposta. - O que ele disse?
- Ele está feliz em vê-la - disse Leonardo. - Suas pupilas se dilataram. É sinal de felicidade por ter ficado esse tempo todo com ele. Leonardo também tinha lido dor no rosto do homem, mas achou desnecessário dizer isso à Gillian. Ele olhou novamente para o homem e percebeu que suas expressões pareciam fracas, preocupantemente fracas. Pareciam estar sem a clareza que normalmente apresentariam. Ele parecia estar esperando por algo.
A moça esboçou um sorriso pelo que Leonardo disse, apesar de continuar triste pela condição de seu amigo. Nesse instante, um médico entrou na sala trazendo vários exames que Gillian tinha feito por causa do acidente. Disse a ela que não corria perigo e que ela ficaria bem. Precisava apenas descansar. Leonardo olhou novamente para Arthur e disse à Gillian:
- Veja! – falou.
- O que ele disse? – perguntou ansiosamente a moça.
- Ele gostou muito de ouvir isso. Está demonstrando que está contente por saber que você não se machucou e que logo estará bem. Olhou mais uma vez para Arthur e repentinamente baixou a voz de uma maneira que até mesmo quem não estava familiarizado com a leitura de expressões faciais poderia saber o que ele demonstrava. Por fim, falou:
- Ele está tranquilo agora.
- Como você sabe? O que ele disse? – quis saber a moça desesperadamente, pensando que isso talvez demonstrasse algum sinal de melhora.
Tristemente Leonardo olhou para Gillian e falou:
- Ele não disse nada. Eu sinto muito.







Eu, Álison

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Queria encontrar um jeito de dizer



Me sinto mal quando tenho coisas para falar a alguém, mas não falo. Mas se você não sabe como falar, você não tem escolha, a não ser continuar se sentindo mal.




Eu, Álison

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Lê-los é o que ele faz

"Um deles era de pequena estatura, musculatura vigorosa, membros fortes, cabeça grande, cabeleira negra e abundante, bigode espesso, olhar vivo e penetrante, toda a sua pessoa impregnada dessa vivacidade meridional que caracteriza em França os filhos da Provença. Diderot, com justiça, afirmou que o gesto do homem é metafórico, e aquele homenzinho era a prova viva dessa asserção. Sentia-se que em sua linguagem habitual devia prodigalizar as prosopopéias, metonímias e hipólages. Fato que, aliás, nunca tive ocasião de verificar porque, em minha presença, usou sempre idioma singular e absolutamente incompreensível.

O segundo desconhecido merece descrição mais minuciosa. Era fácil de ler em sua fisionomia. Reconheci, sem hesitar, as suas qualidades dominantes: a confiança em si, porque a sua cabeça assentava nobremente sobre o arco formado pela linha dos ombros e seus olhos negros fitavam com impassível segurança. A calma, porque a sua pele, tendendo mais para a palidez do que para o corado, denunciava o equilíbrio sanguíneo. A energia, demonstrada pela facilidade de contração dos músculos superciliares e, enfim, a coragem, porque a sua respiração profunda denotava grande expansão vital.

Acrescentarei que sua altivez era visível, que seu olhar firme e claro parecia refletir pensamentos elevados e que todo esse conjunto, a homogeneidade das expressões, do gesto, do corpo e do semblante, segundo a observação dos fisionomistas, sugeria indiscutivelmente a sua franqueza.

Senti-me, involuntariamente, tranquilo na presença dele e augurei bem de nossa entrevista.

Se tinha trinta e cinco ou cinquenta anos, não me teria sido possível precisar. Sua estatura elevada, sua testa larga, seu nariz reto, sua boca nitidamente desenhada, seus dentes magníficos, suas mãos finas e alongadas eram dignos de servirem a alma altiva e apaixonada. Aquele homem constituía indubitavelmente o mais admirável tipo humano que até então me fora dado encontrar.

Particularidade estranha, os olhos dele, um pouco afastado um do outro, podiam abarcar simultaneamente cerca de um quarto do horizonte. Esta faculdade, como verifiquei mais tarde, era reforçada por capacidade visual superior a de Ned Land. Quando esse desconhecido fitava um objeto, a linha das sobrancelhas franzia-se, suas grandes pálpebras cerravam-se de modo a circunscrever-lhe a pupila dos olhos, restringindo assim a extensão do campo visual. Que olhar aquele! Como aumentava os objetos diminuídos pela distância! Como nos devassava até a alma!"


Trecho de "Vinte Mil Milhas Submarinas" de Julio Verne




Eu, Álison