Algo melancólico é verdade, mas a própria melancolia lhe quadrava ao melancólico temperamento.
Ao sabor das ondas, no mar dos sons, sem encontrar à vista a seguridade de um porto.
Tchaikovsky, não raro, sentia possuí-lo uma sensação esquisita quando caminhava pelas ruas ou regia no Conservatório. Dir-se-ia que a cabeça estivesse prestes a cair-lhe dos ombros. Era um caso mau de nervos. Cãibras cardíacas, dores de cabeça e crises de indigestão.
No Conservatório, era tido por um enigma. Não obstante, mostrava-se sempre um gentil homem, embora frio, aristocrático e distante. Contudo, continuava a ser, como sempre, infeliz. Dizia-se mal dele, que era esquisito, que era incapaz de amar normalmente uma mulher.
Far-lhe-ia bem o casamento se lograsse encontrar a mulher que lhe conviesse. E enquanto Tchaikovsky se entretinha em procurar essa mulher, a mulher o encontrou. Era uma criaturinha moça, atraente, histérica e agressiva. Peter cedera, unicamente por fraqueza, avisando-a de que a não poderia amar, de que era pobre, insociável, irritável por natureza e intratável. Casaram-se e, por um momento, Tchaikovsky foi feliz.
“Sem embargo, olho para tudo isso com a mais profunda repugnância”. O grito medonho continuava a espancar-lhe o ouvido interior: “Sou um anormal!”. Precipitou-se para fora do apartamento e pôs-se a correr cegamente pelas ruas escuras da cidade. Quando deu por si estava à beira do rio Moscóvia. Penetrou as águas geladas, até a cintura, e retornou depois, cambaleante, a casa, anelando por apanhar uma pneumonia e morrer. “Ele acaba de passar por uma tensão muito grande. Qualquer coisa o abalou terrivelmente”. Mandaram-no para um sanatório. “Com a ajuda de Deus você recobrará a saúde... A música volverá a interessá-lo e a encher a sua vida”.
Mas Peter é que a havia escrito e, portanto, não podia ser senão uma melodia vinda de Deus.
Quando um homem põe toda a alma num trabalho espera que sejam reconhecidos os seus esforços. ”Não há nela uma única frase que eu não tenha sentido profundamente: todas as suas notas são outros tantos ecos da parte mais sincera da minha natureza”.
À medida que o nosso desespero se torna cada vez mais forte, buscamos fugir à realidade e mergulhamos na ilusão dos sonhos... A pouco e pouco os nossos sonhos senhoreiam-se da alma. A vida de Tchaikovsky era uma alternância de fantasia e realidade, de ventura e angústia. Estados exultantes de espírito quando compunha a sua música, ideias de suicídio quando obrigado a enfrentar o mundo.
Não há de o homem, contudo, enrodilhar-se para sempre aos próprios sofrimentos. Momentos há em que é bom fugirmos de nós mesmos, esquecermos as tristezas passadas e as esperanças futuras, e vogarmos, impessoalmente, fora do tempo e do espaço, sentindo, em vez de emoções definidas, uma sucessão de caprichos arabescos, essas imagens intangíveis que nos perpassam no espírito.
"Se não podes encontrar alegria dentro em ti mesmo, procura-a nos outros”. Vê – vê como ele sabe aproveitar, da melhor maneira possível, seu tempo. Se o prazer não é dado a Tchaikovsky, fuja ele aos sombrios pensamentos e observe como os outros se entregam ao prazer. “Vê como são alegres os demais! E quanta ventura existe em ser-se guiado por sentimentos tão simples”. A gente só pode sobrepujar a tristeza do próprio destino, regozijando-se das alheias alegrias.
Eu, Álison
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