segunda-feira, 23 de julho de 2012

P. I. Tchaikovsky

Não se lhe detinham os olhos nas mulheres nem os ouvidos ouviam ternos murmúrios de amor. Dizia-se que ele tinha medo ao amor, à amizade, a todo e qualquer contato humano. Ele era só porque era grande, como uma estátua colocada sobre um pedestal, que pudesse olhar por cima das cabeças da multidão, mas não pudesse descer para sentir o contato de uma mão humana. Pode uma estátua inspirar veneração, mas não pode exigir amor.
Algo melancólico é verdade, mas a própria melancolia lhe quadrava ao melancólico temperamento.
Ao sabor das ondas, no mar dos sons, sem encontrar à vista a seguridade de um porto.
Tchaikovsky, não raro, sentia possuí-lo uma sensação esquisita quando caminhava pelas ruas ou regia no Conservatório. Dir-se-ia que a cabeça estivesse prestes a cair-lhe dos ombros. Era um caso mau de nervos. Cãibras cardíacas, dores de cabeça e crises de indigestão.
No Conservatório, era tido por um enigma. Não obstante, mostrava-se sempre um gentil homem, embora frio, aristocrático e distante. Contudo, continuava a ser, como sempre, infeliz. Dizia-se mal dele, que era esquisito, que era incapaz de amar normalmente uma mulher.
Far-lhe-ia bem o casamento se lograsse encontrar a mulher que lhe conviesse. E enquanto Tchaikovsky se entretinha em procurar essa mulher, a mulher o encontrou. Era uma criaturinha moça, atraente, histérica e agressiva. Peter cedera, unicamente por fraqueza, avisando-a de que a não poderia amar, de que era pobre, insociável, irritável por natureza e intratável. Casaram-se e, por um momento, Tchaikovsky foi feliz.
“Sem embargo, olho para tudo isso com a mais profunda repugnância”. O grito medonho continuava a espancar-lhe o ouvido interior: “Sou um anormal!”. Precipitou-se para fora do apartamento e pôs-se a correr cegamente pelas ruas escuras da cidade. Quando deu por si estava à beira do rio Moscóvia. Penetrou as águas geladas, até a cintura, e retornou depois, cambaleante, a casa, anelando por apanhar uma pneumonia e morrer. “Ele acaba de passar por uma tensão muito grande. Qualquer coisa o abalou terrivelmente”. Mandaram-no para um sanatório. “Com a ajuda de Deus você recobrará a saúde... A música volverá a interessá-lo e a encher a sua vida”.
Mas Peter é que a havia escrito e, portanto, não podia ser senão uma melodia vinda de Deus.
Quando um homem põe toda a alma num trabalho espera que sejam reconhecidos os seus esforços. ”Não há nela uma única frase que eu não tenha sentido profundamente: todas as suas notas são outros tantos ecos da parte mais sincera da minha natureza”.
À medida que o nosso desespero se torna cada vez mais forte, buscamos fugir à realidade e mergulhamos na ilusão dos sonhos... A pouco e pouco os nossos sonhos senhoreiam-se da alma. A vida de Tchaikovsky era uma alternância de fantasia e realidade, de ventura e angústia. Estados exultantes de espírito quando compunha a sua música, ideias de suicídio quando obrigado a enfrentar o mundo.
Não há de o homem, contudo, enrodilhar-se para sempre aos próprios sofrimentos. Momentos há em que é bom fugirmos de nós mesmos, esquecermos as tristezas passadas e as esperanças futuras, e vogarmos, impessoalmente, fora do tempo e do espaço, sentindo, em vez de emoções definidas, uma sucessão de caprichos arabescos, essas imagens intangíveis que nos perpassam no espírito.
"Se não podes encontrar alegria dentro em ti mesmo, procura-a nos outros”. Vê – vê como ele sabe aproveitar, da melhor maneira possível, seu tempo. Se o prazer não é dado a Tchaikovsky, fuja ele aos sombrios pensamentos e observe como os outros se entregam ao prazer. “Vê como são alegres os demais! E quanta ventura existe em ser-se guiado por sentimentos tão simples”. A gente só pode sobrepujar a tristeza do próprio destino, regozijando-se das alheias alegrias.





Eu, Álison

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