sábado, 8 de junho de 2013

Abandonei-me ao desespero

E esse desejo ardente insondável que tem a alma de se torturar a si mesma - de violentar a sua própria natureza - de praticar o mal por amor do mal - que me impeliu a continuar e finalmente a consumar a injúria que tinha infligido ao inocente bruto. Uma manhã, a sangue frio, passei um laço pelo seu pescoço e enforquei-o no ramo de uma árvore. Enforquei-o com as lágrimas a saltarem-me dos olhos e o mais amargo remorso no coração.
[...]
Pegando num machado e esquecendo na minha fúria o meu medo pueril que até aí havia sustido a minha mão, lancei ao animal um golpe que teria sido mortal se o atingisse, mas a mão da minha mulher interpôs-se. Esta intervenção espicaçou a minha raiva até torná-la demoníaca. Soltei o braço e enterrei-lhe o machado no crânio. A minha mulher caiu morta no chão, sem soltar sequer um gemido.
[...]
Um gemido, a princípio surdo e quebrado como os soluços de uma criança, que rapidamente se transformou num grito longo, alto e contínuo, completamente anormal e inumano - um uivo - um berro crescente, misto de horror e de triunfo, como só poderia ser soltado no Inferno pelas gargantas dos condenados na agonia e dos demônios que exultam a danação.

Retirado de 'O Gato Preto', de Edgar Allan Poe.







Eu, Álison

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