sábado, 30 de março de 2013

Abraçar e saborear

Sobre a essência inflamada da saudade, podemos ainda enunciar os seguintes paradoxos: é um mal de que se gosta, e um bem que se padece. A saudade faz aflorar sentimentos de reconhecimento por um bem ausente que, aspiramos, retorne ao seu lugar em nossa vida; não difere de um bem efetivamente perdido, pois também há saudade de bens que ainda não foram possuídos, nem perdidos definitivamente, mas que permanecem esperados, sendo assim a lembrança de algo muito especial com o desejo de estarmos próximo dele.
É própria do ser pelo qual nutrimos afinidade a existência de uma considerável relação de proximidade, que estimula a convivência regular dos encontros. Por isso, quando tal ser se ausenta, sentimos a marca inflamada da saudade, um trágico vazio existencial que o usufruto de nenhum bem material pode preencher satisfatoriamente, pois tal disposição interior nasce de uma experiência pura do reconhecimento da alteridade do ser ao qual nos afeiçoamos. Nelci Silvério de Oliveira aponta que a saudade consiste em "abraçar e saborear lentamente a presença de uma ausência, a ausência de uma presença". A saudade permite reconhecer o digno valor da toda condição que, de algum modo, nos complementa existencialmente, circunstância que demonstra a matriz ética subjacente nessa disposição sentimental.
O amor e a ausência são os pais da saudade. Na experiência da saudade, a solidão que decorre da ausência do ser que amamos nos desperta a inclinação para saudá-lo simbolicamente, evocando, mais uma vez, sua presença junto de nós. A saudade nos faz refletir e, sobretudo, sentir com mais vigor, presença e intensidade, o nosso amor e a ausência dos entes e das coisas que queremos bem.


"Toda saudade é amor, e amar é conhecer alguém. Ninguém tem saudade do que não ama e ninguém ama o que não conhece".





Eu, Álison

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